Drama no fundo do mar: as iniciativas que tentam conter o desastre dos corais 4z4z1c
Com a maioria deles sob risco por causa do aquecimento global, ações que mesclam inteligência artificial, drones e outros recursos tentam mitigar danos 5r4j45

É triste. O planeta atravessa a mais grave crise de branqueamento de corais já registrada. Desde janeiro de 2023, 84% dos recifes tropicais da Terra foram expostos a níveis críticos de calor, segundo a istração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA). O fenômeno, que já afeta mais de oitenta países e territórios, é impulsionado pelo aquecimento anormal dos oceanos — resultado das emissões de gases de efeito estufa. O aquecimento dos mares está tornando as ondas de calor oceânicas mais frequentes, duradouras e intensas. Com isso, os recifes têm menos tempo para se recuperar entre um evento extremo e outro. “Estamos vivendo um oceano febril”, resume Ronaldo Christofoletti, membro da rede de pesquisadores do INPO (Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas) e professor da Unifesp. “O que antes levava décadas agora acontece em dois ou três anos.”

Como resposta ao drama, de fácil identificação, dada a mudança de cores, há um promissor movimento de resposta da ciência. Multiplicam-se iniciativas para o controle do desastre ambiental, um modo de proteger o que resta — ou recuperar o que já se perdeu. Sensores e satélites de alta resolução permitem mapear recifes em tempo real e prever eventos de branqueamento com semanas de antecedência. Drones subaquáticos ajudam a monitorar as áreas mais profundas, enquanto algoritmos de inteligência artificial (IA) processam grandes volumes de dados para identificar padrões de fragilidade e resiliência em diferentes regiões do globo.
As iniciativas de tecnologia chegaram ao Brasil. Em Pernambuco, o projeto Coralizar, que reúne pesquisadores da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), usa impressoras 3D para produzir berços onde fragmentos de coral ainda coloridos são fixados e levados ao mar. Esses es personalizados servem de base para que novas colônias se desenvolvam em áreas protegidas. Em paralelo, o Instituto Coral Vivo, na Bahia, lidera a criação de um banco de gametas congelados de corais — técnica conhecida como criopreservação — para preservar espécies ameaçadas e reforçar a diversidade genética dos recifes. Pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR) testam ferramentas de IA para agilizar o monitoramento de recifes.

É corrida contra o tempo para salvar esses ecossistemas que abrigam uma rica diversidade de vida marinha e são capazes até de fornecer proteção contra ondas e tempestades. Em 2021, foi criada a Década das Nações Unidas da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, também chamada de Década do Oceano. Se o mundo ultraar 1,5 grau de aquecimento — limiar que pode ser atingido já na próxima década —, 99% dos recifes tropicais estarão fadados à morte parcial. Em um cenário ainda mais extremo, com 2 graus, praticamente todos os recifes desaparecerão.
Não por acaso, os trabalhos se expandem. Há projetos de restauração de recifes de corais em pelo menos 56 países, a maioria no Caribe e no Sudeste Asiático. Na Austrália, programas de restauração na Grande Barreira de Corais, um patrimônio da biodiversidade marinha local, concentram-se em desenvolver e testar intervenções tecnológicas, como a reconstrução baseada em colônias de larvas e uma técnica de “jardinagem de corais”, desenvolvida pela Coral Restoration Foundation, na Flórida.
Há urgência, e convém olhar para o Brasil. Biólogos já registraram branqueamento quase total em pontos da Costa dos Corais, faixa litorânea protegida entre os estados de Pernambuco e Alagoas. A perda do colorido é metáfora da própria existência. Ela indica que os corais expeliram as algas que vivem em simbiose com eles e são sua principal fonte de energia. Sem essa associação, os organismos ficam mais suscetíveis a doenças e podem morrer em questão de semanas. O conhecimento atrelado a recursos de ponta é o único caminho de salvação, além do zelo do ser humano, que anda rareando. O futuro desses mananciais, patrimônio da humanidade, depende diretamente das decisões tomadas agora. Não dá mais para esperar.
Publicado em VEJA de 23 de maio de 2025, edição nº 2945