Pesquisadores tentam tirar do risco de extinção o rinoceronte-de-sumatra 5v2c3d
Trata-se da menor e mais antiga espécie do animal asiático 13u39

O rinoceronte-de-sumatra já foi encontrado em grande número no leste e sudeste da Ásia, mas hoje apenas algumas dezenas de animais vagam pelas florestas tropicais da ilha e na parte indonésia de Bornéu. Conservacionistas afirmam que, das cinco espécies ainda existentes do segundo maior mamífero terrestre, esta é uma das mais ameaçadas — restam apenas cerca de oitenta no mundo — em razão da caça e da destruição de seu hábitat. Para reverter essa situação, o governo da Indonésia e especialistas de organizações independentes tentam, desde os anos 1980, reunir as populações selvagens restantes, dispersas e fragmentadas, em instalações de reprodução assistida. No entanto, os resultados, até agora, são de pouca monta. Outra iniciativa, com melhores perspectivas, busca soluções científicas para superar a atual dificuldade de acasalar machos e fêmeas.
Um dos caminhos envolve o uso de amostras de pele do último rinoceronte-de-sumatra macho da Malásia, conhecido como Kertam, que morreu em maio de 2019. A partir delas, um grupo internacional de cientistas cultivou células, com o pomposo nome de células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs), capazes de se dividir infinitamente (sem morrer) e também de se transformar em qualquer tipo de corpúsculo do organismo. Trabalha-se também com um outro recurso, o de organoides da espécie. Conhecidos como minicérebros e fabricados com essas mesmas células versáteis, ajudam a conhecer a evolução do cérebro em mamíferos e podem desvendar a história pregressa da família dos rinocerontes.

A ideia do grupo, de acordo com celebrado artigo publicado na revista iScience, é usar as células-tronco cultivadas também para criar óvulos e espermatozoides, em fenomenal salto de conhecimento. O plano é utilizar os gametas em processos de fertilização em laboratório. O embrião resultante seria inserido em uma fêmea substituta, iniciando uma nova cadeia reprodutiva desses animais. A obtenção das células reprodutivas é vital para isso. “Como a qualidade do sêmen de rinocerontes-de-sumatra é ruim logo após a coleta e ainda pior após a preservação em gelo e descongelamento, os espermatozoides gerados in vitro oferecem uma ótima alternativa para a reprodução assistida”, diz Vera Zywitza, cientista do Centro Max Delbrück, na Alemanha, e principal autora do estudo.
Há, contudo, muitos obstáculos pela frente, a começar pela dificuldade em encontrar a fêmea para gestar. “As fêmeas que não engravidam há muito tempo geralmente se tornam inférteis ou podem ser velhas para gerar filhotes de forma natural”, diz Zywitza. Um o para tornar ao menos essa última tarefa menos complexa já foi dado. Especialista em reprodução do Instituto Leibniz de Pesquisa em Zoológicos e Vida Selvagem e coautor da pesquisa, Thomas Hildebrandt explica que o governo da Indonésia reuniu parte dos indivíduos restantes em reservas de vida selvagem, o que facilitará a identificação das fêmeas aptas a participar do processo.
Os produtos obtidos a partir da pele de Kertam servem ainda a outro propósito: obter informações sobre a evolução do desenvolvimento de órgãos. Por isso, Silke Frahm-Barske, outra participante da pesquisa, cultivou os chamados organoides cerebrais ou minicérebros. “Até onde sabemos, eles só haviam sido obtidos de camundongos, humanos e primatas não humanos até agora”, disse.
As tentativas de preservar o rinoceronte-de-sumatra, a menor e mais antiga espécie viva de rinoceronte, são louváveis, claro. Mas eles sabem que outras frentes precisam avançar. “Embora nosso trabalho esteja tentando tornar possível o que é aparentemente impossível — garantir a sobrevivência de animais que provavelmente desapareceriam do planeta —, isso deve permanecer uma exceção, e não regra”, enfatiza Zywitza. “O que fazemos pode, na melhor das hipóteses, dar uma pequena contribuição para salvar esses animais da extinção.” Trata-se, portanto, de proteger e conservar os poucos hábitats remanescentes desses belos mamíferos. É o mínimo que se pode fazer por eles, pelo bem da biodiversidade do planeta — em nome também da humanidade.
Publicado em VEJA de 1º de fevereiro de 2023, edição nº 2826