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Um olhar diferente para as desigualdades do Brasil

Precarização sanitária ameaça Amazônia e é desafio para a COP30 5b471f

Palco do maior evento ambiental do planeta, a COP30 deve chamar a atenção do mundo para os impactos das atividades predatórias e da falta de saneamento 2sl66

Por Andréia Peres 13 Maio 2025, 08h30

A emergência de saúde pública na terra indígena ianomâmi, decretada pelo governo federal em 20 de janeiro de 2023, mostrou para o Brasil e para o mundo uma realidade de abandono que há décadas impacta a região Norte, especialmente as populações indígenas, ribeirinhas e quilombolas.

“Nas últimas quatro décadas, o bioma amazônico tem sido criticamente ameaçado pelo avanço de atividades predatórias, bem como pelas devastadoras queimadas de extensas áreas florestais”, diz Jesem Orellana, doutor em Epidemiologia e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Amazônia há quase 20 anos, em entrevista à coluna.

Orellana e o antropólogo João Paulo Barreto Tukano são autores do artigo Precarização sanitária ameaça Amazônia, publicado recentemente no Atlas da Amazônia Brasileira, da fundação alemã Heinrich Böll Stiftung. O epidemiologista avalia que, em maior ou menor intensidade, essas intervenções têm impactado negativamente a saúde da população.

Segundo ele, “indicadores sobre saúde e doença na Amazônia evidenciam um dos mais desfavoráveis cenários sanitários do país”. Entre os exemplos mais impactantes estão a malária, a tuberculose e a febre amarela.

70% DOS CASOS DE FEBRE OROPOUCHE FORAM NA REGIÃO NORTE

“O mosaico sanitário amazônico ainda conta com o trágico desenvolvimento de epidemias de doenças emergentes e reemergentes, como a febre oropouche”, diz o artigo. Em 2024, foram quase 6 mil casos confirmados na região Norte, mais de 70% do total nacional.

Soma-se a isso o precário o à saneamento na região Norte. Segundo o último Censo do IBGE, apenas um a cada cinco domicílios da região Norte tem o à coleta de esgoto.

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“Não é coincidência que, em 2021, o número de internações hospitalares por dengue no Norte aumentou 27% em comparação a 2020”, diz ele. Em geral, este padrão se repete para internações por leptospiroses ou diarreia e gastroenterite. “Nesse precário cenário de saneamento, há um leque de doenças infecciosas e negligenciadas, endêmicas em regiões de baixo desenvolvimento humano e social, associadas a incapacidades, adoecimento e mortes evitáveis”, ressalta.

SEQUELAS DA COVID-19 PERSISTEM ATÉ HOJE

A pandemia de covid-19, que provocou chocantes colapsos funerários sobretudo em Manaus, deixou sequelas, ampliando vulnerabilidades assistenciais e socioeconômicas. “O que já era ruim ficou pior ao longo do tempo”, resume Orellana.

Entre março de 2020 e fevereiro de 2022, foi registrado no norte amazônico cerca de um quarto a mais (27%) de suicídios em mulheres com 30 a 59 ano e cerca de 70% mais mortes maternas do que seria esperado sem a pandemia. Impactos que são sentidos até hoje.

“A covid-19 teve consequências indiretas sobre o acompanhamento de gestantes e sobre a infraestrutura médico-hospitalar que acabaram gerando distorções graves, como a ocorrência de mortes que poderiam ter sido evitadas, como é o caso da mortalidade materna”, analisa o epidemiologista.

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Outra questão preocupante, segundo ele, são as baixas taxas de cobertura vacinal, sobretudo em crianças com um ano ou mais. “As coberturas vacinais da tetra viral (sarampo, caxumba, rubéola e varicela), da tríplice bacteriana (difteria, tétano e pertussis) e da hepatite A se situaram abaixo de 7%, 55% e 60%, respectivamente. Abaixo das coberturas de outras regiões do Brasil e longe os 95% esperados”, diz Orellana, citando dados do final de 2022, os últimos disponíveis.

Além das fake news, os desafios logísticos também são empecilhos importantes à vacinação. “Devido à seca, o município de Ipixuna (AM), por exemplo, ficou seis meses consecutivos sem receber material de saúde, como odontológico e para tratar diarreia”, exemplifica o especialista.

Um cenário que, de acordo com ele, vem começando a mudar. “Foi feito um trabalho muito forte nos últimos anos de vacinar milhões de crianças nas escolas. Aos poucos, estamos revertendo essa situação”, diz ele, que também acredita que a volta de casos, como o de sarampo e de febre amarela, tem mostrado para a população o risco de desacreditar a ciência, ajudando a alterar esse quadro.

INSEGURANÇA ALIMENTAR E DIABETES

Com estados como Amazonas, Amapá e Pará com maiores proporções de sua população residindo em favelas e comunidades urbanas, segundo o IBGE, os índices de insegurança alimentar e nutricional também preocupam. Segundo o pesquisador, no Amapá e no Pará a insegurança alimentar chega a superar os 30% da população.

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“Entre quilombolas e indígenas, observamos indicadores semelhantes ao da África subsaariana ou de alguns países da Ásia”, lamenta Orellana.

Muitas crianças sofrem, inclusive, o que os especialistas chamam de dupla carga de problemas nutricionais. Ou seja, estão, ao mesmo tempo, acima do peso e desnutridas. Doenças como a diabetes, associada à obesidade, sedentarismo e hábitos alimentares não saudáveis constituem, de acordo com o epidemiologista, um sério desafio na região amazônica, com taxa de mortalidade alcançando 40,3 por 100 mil no Amazonas, um valor 50% maior que a média nacional. Regionalmente, a taxa de mortalidade é de 33,1 por 100 mil habitantes.

Apesar dos esforços recentes para alterar essa situação, o pesquisador não acha viável enxergarmos mudanças em curto prazo. Para Orellana, iniciativas do governo federal para promover a atenção primária em saúde para populações de águas, rios e florestas podem fazer a diferença em médio e longo prazo e devem vir acompanhadas de investimentos em saneamento básico e valorização dos saberes ancestrais. “Até hoje, esse tipo de assistência legítima é ignorado pela rede de saúde, tanto em comunidades quanto em populações indígenas”, diz ele.

Pesquisador na Fiocruz Amazônia, há quase 20 anos, Jesem Orellana lamenta a falta de participação das instituições locais e mesmo de ribeirinhos, quilombolas e indígenas nos preparativos da conferência. “As mudanças climáticas agravaram a situação de vulnerabilidade da região e é frustrante que nós não tenhamos voz ativa nessa discussão”, afirma.

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Historicamente, a exclusão e a invisibilidade têm sido uma marca forte na região, deixando sequelas graves, como a precarização sanitária e de saúde. Uma situação que a COP30 pode ajudar a mudar, provocando discussões, debates e avanços, com ampla participação de instituições e populações locais.

* Jornalista e diretora da Cross Content Comunicação. Há mais de três décadas escreve sobre temas como educação, direitos da infância e da adolescência, direitos da mulher e terceiro setor. Com mais de uma dezena de prêmios nacionais e internacionais, já publicou diversos livros sobre educação, trabalho infantil, violência contra a mulher e direitos humanos. Siga a colunista no Instagram.

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