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O acordo EUA-China salvou o Brasil de uma recessão, diz economista do J.P. Morgan

Em entrevista a VEJA, Cassiana Fernandez fala sobre as revisões feitas pelo banco nesta semana depois de as duas potências anunciarem uma trégua nas tarifas

Por Juliana Elias Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 16 Maio 2025, 08h02

Em menos de uma semana, o J.P. Morgan, um dos maiores bancos do mundo, revisou radicalmente suas projeções para o crescimento dos Estados Unidos, da China e da economia global, o que, por conseguinte, levou a uma mudança – para melhor – também nas perspectivas para o Brasil.

Até a semana ada, antes do anúncio de um primeiro acordo comercial e uma trégua de noventa dias nas guerra tarifária entre Estados Unidos e China, o banco americano figurava entre as instituições mais pessimistas e dava como inevitável um período de recessão no segundo semestre tanto nos EUA quanto no Brasil. Este cenário foi riscado em todos os casos e voltou para o positivo tão logo o novo combinado de Donald Trump e Xi Jinping foi anunciado no começo da semana. “Foi um acordo muito significativo e a melhora na revisão, em especial da China, é muito relevante para a economia brasileira”, diz Cassiana Fernandez, chefe de pesquisa econômica para a América Latina e economista-chefe para Brasil do J.P. Morgan.

Em entrevista a VEJA, Fernandez conta que, por outro lado, mesmo com a melhora, a expectativa para o Brasil é ainda de uma desaceleração forte na atividade a partir da segunda metade deste ano, o que continua sustentando a visão do banco de que o Banco Central brasileiro poderá começar a cortar a taxa de juros, a Selic, ainda em 2025.

Enquanto analistas de todo o mercado ainda tentam decifrar quais serão os próximos os no caminho deixado em aberto pelo Banco Central, a aposta do J.P. Morgan é de que o BC deve fazer uma última e pequena elevação na Selic na próxima reunião, em junho, até chegar aos 15%. Por outro lado, frente a uma forte desaceleração que já está encomendada de toda forma, os cortes poderão começar ainda em dezembro, com a Selic terminando 2025 de volta aos 14,75% e 2026 nos 10,75%.

Entre os principais redesenhos feitos no cenário global e no nacional nesta semana, o J.P. Morgan elevou nesta semana a projeção do PIB dos EUA de 1,2% para 2%, o da China de 4,1% para 4,8% e, o do Brasil, de 1,9% para 2,3%. Por outro lado, a taxa de juros decidida pelo Federal Reserve, o banco central norte-americano, também deve agora cair menos e mais devagar, recuando do atual teto de 4,5% para 3,5% e só no meio do que vem.

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Veja a seguir os principais trechos da conversa.

O JP Morgan reduziu nesta semana a probabilidade de recessão global dos EUA de 60% para menos de 50%, e fez revisões importantes de crescimento para todo o mundo. Desde o grande ‘tarifaço’ de Donald Trump, em abril, prevalecia a perspectiva de recessão. O que moveu essa mudança? Muita coisa muda com o acordo entre Estados Unidos e China. Até então, o cenário base do banco era de uma recessão técnica nos Estados Unidos, com quedas de 0,5% no PIB [produto interno bruto] do terceiro e do quarto trimestre [comparados aos mesmo trimestre um ano antes]. Isso não deve mais acontecer, vai ficar em um terreno levemente positivo. O acordo com a China foi muito significativo. A tarifa entre eles sai de 145% para 30%, e só isso gera uma redução na arrecadação dos Estados Unidos de cerca de 300 bilhões de dólares. É dinheiro que sobra para os consumidores e tem impacto no crescimento. Com a trégua, a China também cresce mais. Então saímos de um cenário de recessão global, com impacto para todos os países, para uma situação que ainda não é boa – é pior do que se esperava no começo do ano -, mas é, sim, menos adversa.

Saímos de um cenário de recessão global, com impacto para todos os países, para uma situação que ainda não é boa – é pior do que se esperava no começo do ano -, mas é, sim, menos adversa.

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É ao menos o terceiro cenário de vocês em dois meses. Ele não pode mudar de novo? O PIB melhor está condicionado às tarifas ficarem mantidas no patamar atual, após o acordo. Mas, dada a volatilidade, é uma hipótese bastante forte que possam mudar, para qualquer dos dois lados: tanto outras economias conseguirem renegociar tarifas mais baixas quanto haver uma reescalada e elas subirem de novo.

Como essas revisões mexem com a perspectiva de crescimento para o Brasil? Na nossa projeção anterior, o PIB brasileiro cairia a uma média de 0,3% no terceiro e no quarto trimestre. A expectativa agora é que cresça 0,5% em cada um deles. O que é, de toda maneira, uma desaceleração importante. A melhora na revisão, em especial da China, é muito relevante para a nossa economia. E não só pelo comércio externo, mas também pelos canais do investimento e da confiança. Se o mundo está em recessão, com uma briga entre as duas maiores economias do mundo e vivendo uma desglobalização, claramente há um menor fluxo de investimento para todos os países e também uma aversão maior ao risco. Os impactos disso sobre o Brasil, na minha opinião, estavam subestimados.

O novo cenário do J.P. Morgan trabalha com a Selic um pouco mais alta e por mais tempo do que era previsto até a semana ada. Ainda assim, vocês acreditam que ela pode começar a cair ainda neste ano. O que deve permitir esse início nos cortes de juros? Na semana ada, acreditávamos que o Banco Central poderia interromper as altas da Selic já agora, nos 14,75%, e começar a cortá-la ainda em setembro, terminando 2025 em 14,25%. Agora entendemos que será necessária mais uma alta em junho, para os 15%. Em dezembro, de toda maneira, ele poderá começar a cortar novamente, mesmo que de maneira mais lenta. O PIB no segundo semestre é muito fraco. É aí que começaremos a ver uma desaceleração mais forte e é também onde estão as principais diferenças entre a nossa visão e o consenso de mercado. Mesmo sem uma recessão, ainda será uma economia global bem mais fraca, o que significa também preços mais fracos em commodities, como o petróleo, e em bens industriais, porque a China, exportando menos para os Estados Unidos, vai começar a procurar os outros mercados com preços mais baratos.

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Traduzindo para o cotidiano essa perspectiva de commodities mais baratas, podemos entender que preços como o da gasolina ou dos alimentos podem ter um alívio até o ano que vem? Ver deflação de alimentos de fato é sempre difícil, mas deve haver aumentos menores, com uma pressão inflacionária bem menor em especial nos combustíveis. Eles certamente crescerão menos que o salário, e isso já faz bastante diferença.

Além das forças externas, há também fatores domésticos que contribuem para essa desaceleração esperada para o Brasil a partir do segundo semestre? É uma combinação de três fatores: o canal externo, um nível de taxa de juros que já está há bastante tempo muito restritivo e também um impulso fiscal que começa a ficar menor, depois de uma enorme expansão. O freio externo claramente mudou nos últimos dias, e deve ser bem mais suave, mas as outras duas coisas não mudaram. Estaremos com os juros a 15%, o que tem um poder de restrição enorme à atividade. E, do lado do governo, por mais que haja pressão, não tem mais espaço para aumentar os gastos dentro das regras atuais do arcabouço fiscal. O governo só consegue isso se propor uma mudança na regra. Mas ele viu, no final do ano ado, quando propôs um pacote de ajuste fiscal junto com a promessa de isenção no imposto de renda, o desgaste que isso causa. Ele também não consegue.

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